Fundos de pensão e investidores pedem R$ 9,3 bi de ressarcimento a bancos

Fundos de pensão e investidores pedem R$ 9,3 bi de ressarcimento a bancos

 

Uma onda de acusações de negligência está alcançando os grandes bancos que prestam serviços de gestão, administração de recursos e custódia para fundos de investimentos. Investidores, fundos de pensão e até mesmo autoridades como a Receita Federal e Ministério Público Federal pedem cerca de R$ 9,3 bilhões de ressarcimento a bancos como BNY Mellon, Bradesco, BTG Pactual, Citibank, Deutsche Bank e Santander, sob a acusação de terem sido omissos na fiscalização de fundos ou corresponsáveis por investimentos que deram errado. Pelo menos sete casos chegaram aos tribunais nos últimos dois anos e as instituições começam a se preocupar também com os efeitos da Operação Greenfield, que foi deflagrada há menos de um mês. Nesta operação estão sendo questionados os investimentos feitos pelos fundos de pensão em Fundos de Investimentos em Participações (FIPs). Os administradores desses fundos, contratados pelas fundações, estão também sob investigação. Há duas semanas, o Bradesco teve de fazer um acordo com o Ministério Público para que seus executivos tivessem liberados os bens que foram bloqueados durante a operação. 

 

O banco se comprometeu a dar um seguro-fiança de R$ 100 milhões para garantir o ressarcimento caso fique comprovada sua responsabilidade pelas perdas sofridas pelo FIP Enseada. O FIP tinha recursos da Funcef, Petros e Previ e investiu em uma empresa derivada da Gradiente. O banco não quis comentar. O valor que está sendo pedido ao Bradesco, no entanto, é ínfimo perto dos R$ 5 bilhões pedidos pelo Postalis, dos Correios, ao BNY Mellon. O banco americano é um dos maiores administradores de recursos do mundo e tinha exclusividade na prestação do serviço para o Postalis, de acordo com o presidente da fundação, André Motta. Segundo Motta, o Postalis pagava R$ 60 milhões por ano ao BNY, que teria, por contrato, se comprometido a preservar os investimentos da fundação. "Este é o contrato que hoje nos protege", afirma. 

 

A conta bilionária foi feita com base no que a fundação deveria ter atingido de rendimento e no que perdeu ao longo dos anos. Além disso, a fundação pede indenização em dois casos específicos: um fundo que aplicou em tí- tulos da dívida argentina e venezuelana e um fundo de crédito chamado Silverado. Em ambos, os gestores são acusados de terem cometido fraudes, gerando prejuízos, e o administrador, de ter negligenciado a fiscalização. O Postalis foi envolvido em uma série de escândalos com alguns executivos sendo acusados de crimes. O BNY não quis falar sobre o assunto. Em nota, afirmou: "Estamos nos defendendo contra as vagas e infundadas alegações formuladas pelo Postalis em ações judiciais, que não se baseiam em fatos". O caso Silverado também envolveu entre os investidores bancos como BTG Pactual, Sul America Investimentos e JP Morgan. Todos buscam ressarcimento de R$ 400 milhões por parte do BNY e de Deutsche Bank e Santander, custodiantes do fundo. 

 

Em sua defesa, na Justiça, os bancos tentam demonstrar que os investidores que questionam as perdas eram qualificados e tinham acompanhamento da gestão dos fundos. Além disso, defendem que seguiram as regras estabelecidas pelos próprios investidores. À reportagem, não quiseram fazer comentários. Santander e Deutsche também estão sendo responsabilizados pelas perdas de R$ 400 milhões no Trendbank, outro fundo de crédito envolvido em fraudes. Os investidores eram, em sua maioria, fundos de pensão. Também o BTG, como administrador, está na lista dos processos, em um caso envolvendo a família do chinês Ban Chun, acionista da BRF Foods e que alega ter perdido R$ 400 milhões em operações de derivativos. O BTG não quis comentar, mas no processo se defende dizendo que Chun era sócio da gestora responsável pelo negócio e sabia dos investimentos. Fisco. Além de investidores, o Fisco está atualmente contestando o papel dos gestores de fundos. No ano passado, o grupo Bertin foi autuado em R$ 3 bilhões pelo processo de fusão com o JBS. Segundo o Fisco, o pagamento do imposto foi evitado por meio de um FIP, do qual o Citibank era administrador e, por esse motivo, deverá responder solidariamente pela autuação. O Bertin está recorrendo. O Citibank não quis comentar.

 

   — Exclusivo —

 

"O BNY tem exclusividade da administração desde 2011. Este é o contrato que hoje nos protege" 

 

André Motta 

PRESIDENTE DO POSTALIS

 

   — PARA ENTENDER —

 

Pelas regras da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), um fundo de investimento está apto a receber investidores se tiver um gestor, um administrador e um custodiante. Cada um desses prestadores de serviços tem um papel específico. O gestor conduz os investimentos da forma como estabelecido no estatuto. Ao administrador cabe a função de fiscalizar a gestão do fundo. Já o custodiante é o responsável pela guarda de títulos e papéis que fazem parte de uma aplicação, como, por exemplo, ações, notas fiscais, debêntures, etc. Também cabe ao custodiante o papel de verificar a autenticidade dos títulos.

 

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Investidores querem fiscalização mais rígida da Anbima e CVM

 

Em meio ao crescente número de pedidos de indenizações contra gestores, administradores e custodiantes de fundos de investimentos, o papel da Anbima e da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) tem sido questionado pelos investidores. Eles querem que ambos façam uma fiscalização mais adequada para impedir que fraudes ou negligência sejam causa das perdas dos fundos. A Anbima é uma associação do setor que reúne esses prestadores de serviços e também faz a autorregulação do mercado de fundos. Ter o selo Anbima é um reconhecimento da credibilidade de um fundo e de seus prestadores de serviços. 

 

"Quando aplicamos no Silverado, os custodiantes e administradores tinham selo Anbima. Pressupomos que estávamos seguros", diz um gestor de recursos que investiu no fundo de crédito, que é hoje acusado de fraude. "Somos investidores qualificados e sabemos o risco de perder com as oscilações de mercado, mas não temos como nos prevenir de fraudes." O superintendente de supervisão da Anbima, Guilherme Benederet, diz que a associação está cumprindo o seu papel e que muitos processos abertos internamente evitaram perdas em outros fundos de investimento. 

 

A fiscalização da Anbima acompanha notícias de jornais e também tem um sistema próprio de acompanhamento das carteiras para tentar apurar irregularidades. Cada vez que um caso é aberto, funciona como um processo administrativo em que gestores, administradores e custodiantes podem se defender. Na maior parte dos casos, se chega a um acordo em que a instituição se compromete a corrigir seus procedimentos e a pagar uma contribuição para a associação, que pode chegar a R$ 3,5 milhões. 

 

A Anbima, no entanto, não forneceu um número consolidado de casos julgados. Já a CVM diz que realiza análise e apuração de fatos a partir de denúncias, reclamações, representações ou solicitações do pú- blico. "Neste aspecto, 100% dos casos que chegam à autarquia são apreciados e apurados pelas áreas competentes", diz a CVM, em nota. "Além disso, informa- ções sobre fundos de investimento são públicas, favorecendo que todo cidadão exerça sua própria supervisão e recorra à CVM sempre que entender necessário ou útil." / J.G


05/10/2016
- O ESTADO DE S. PAULO - SP
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