Casais sem filhos e idosos sozinhos são 42% dos lares na 3ª idade

Casais sem filhos e idosos sozinhos são 42% dos lares na 3ª idade

 A família brasileira mudou nas últimas três décadas: ficou menor, mais diversa e com mais idosos sozinhos. O livro "Política Nacional do Idoso, velhas e novas questões" editado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), mostra que, em 42,1% dos lares com idosos, eles vivem sozinhos ou são casais sem filhos, diz a economista Ana Amélia Camarano, uma das organizadoras da obra e especialista no estudo da terceira idade. Pssa proporção era bem menor há 31 anos: eram 25,9% em 1983. E a mulher sozinha predomina nos arranjos familiares. A explicação está na expectativa de vida maior da mulher. Em 2014, era de 78,8 anos, sete anos e dois meses mais que os homens. A esperança de vida masculina é de 71,6 anos.

 – O arranjo familiar mais frequente nos lares onde há idosos é o da mãe sozinha com filhos e o da mulher sozinha. Representam 36% dos arranjos. Os casais com filhos, que respondiam por 43,7% do total em 1980, caíram para 25,5 em 2014 – afirma Ana Amélia.

 Segundo a economista, essa mudança na composição familiar reduz o leque de cuida-dores para idosos mais frágeis, mais velhos.

 Pesa ainda o fato de a oferta de lares para idosos ser baixa. São 3.548 instituições, cobrindo 28,9% das cidades brasileiras. E a maior parte, 64,2%, é de entidades privadas sem fins lucrativos. As públicas respondem por 6,6% e seriam destinadas aos idosos sem parentes. O Estatuto do Idoso determina que a família é responsável por cuidar dos idosos e criminaliza os cuida-dores familiares que não cumprem esse papel.

 – Idoso sofre discriminação, violência emocional, física, psicológica. Não ter uma política de cuidados resulta em violência. Não se considera o estresse do cuidador familiar, que é responsável 365 dias por ano, sem qualquer ajuda. Isso pode levar à violência causada pelo estresse do cuidador – diz Ana Amélia.

 MAIS DESIGUALDADE NA VELHICE

 A economista cita o exemplo de países como Japão, Alemanha e Inglaterra, que têm a chamada política do respiro. O governo manda um cuidador para a casa do idoso, com objetivo de liberar um pouco a família:

 – Divide a responsabilidade com o mercado privado.

 O idoso quando não é chefe de família ou cônjuge é o que fica mais exposto ao que os pesquisadores chamam de violência estrutural. E a desigualdade é maior nessa faixa etária, diz Ana Amélia no livro.

 – Há uma heterogeneidade muito grande entre os idosos. Há os mais ativos, que ainda participam do mercado de trabalho, e os mais frágeis, acamados. A sociedade brasileira é muito desigual, e isso se intensifica na velhice. Nascem em berços diferentes, têm trajetórias de vida diferentes, envelhecem de forma diferente também – explica.

 Marli Rosa Pereira, de 70 anos, conseguiu se aposentar aos 65 anos. Vive com três amigos, depois que o irmão a expulsou de casa quando a mãe morreu.

 – Ele me expulsou, me bateu. Vivi de casa em casa de amigos, até encontrar esse lugar. Fiz queixa na delegacia, mas depois desisti. Fiquei com medo – conta Marli.

 PRODUÇÃO CULTURAL E TURISMO

 O psicólogo e consultor em planejamento, acompanhamento e avaliação de programas de preparação para a aposentadoria José Carlos Ferrig-no lembra do papel de transmissor cultural do idoso:

 – Ele é o canal da preservação da sua história, da sua biografia, da história da cidade. É um papel fundamental de preservação dessa memória. Idoso tem de ser visto como um professor.

 Ferrigno usa as escolas de samba e as manifestações religiosas como exemplo, onde os mais velhos trabalham firmemente na produção e com informações para os mais jovens:

 – As velhas cabrochas, as baianas, os compositores, diretores de bateria, são, geralmente, mais velhos e representam um exemplo para as novas gerações.

 E há um mercado a explorar, principalmente no turismo, aponta Ferrigno. No programa Viaja Mais Melhor Idade, do Ministério do Turismo, foram vendidos, entre agosto e dezembro de 2007, nove mil pa cotes e, ao longo de 2008, cerca de 200 mil.

 RISCOS NA VELHICE

 MORTES POR QUEDAS AUMENTAM

 As quedas respondem por 2 5,4% do total de mortes por causas externas entre os idosos, logo atrás dos acidentes de trânsito. E esse percentual vem aumentando. Conforme estudo de Ana Amélia Camarano, essa proporção era de menos de 10% em 1980. Asquedas atingem principalmente as mulheres, respondendo por 43,8% dos óbitos femininos.

 "As causas estão relacionadas diretamente à circulação dos idosos pelos espaços públicos, que, apesar das leis existentes como intuito de normatizá-los, são ainda bastante inadequados. À medida que os idosos passam a utilizarmaisoespaçoda rua no seu cotidiano, tornam-se mais suscetíveis e vulneráveis a acidentes", ressalta a pesquisadora no estudo.

 Os idosos mais velhos também são mais vítimas dos tombos. Entre os que têm mais de 80 anos, esta é a principal causa de mortes por motivos externos.

 As principais causas de morte de idosos permanecem as internas: são doenças do aparelho circulatório. Isso se aplica tanto a mulheres quanto a homens. 

 (Cássia Almeida)

 "O idoso tem um papel fundamental de preservação da memória do país. Ele tem de ser visto como um professor"

 José Cario Ferrigno 

Psicólogo

25/10/2016
- ANABB
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