Presidente do BB diz que instituição resgatou papel de agente indutor do país

Presidente do BB diz que instituição resgatou papel de agente indutor do país

Por mais otimista que estivesse há um ano, quando assumiu a presidência do Banco do Brasil (BB) sob desconfiança de que administraria a estatal com viés político, Aldemir Bendine dificilmente imaginaria o bom momento que está vivendo. Sob sua batuta, o BB voltou a ser a maior instituição financeira do país e começou a comprar bancos no exterior. Recentemente, recebeu autorização para aquisições nos EUA. De Buenos Aires, onde anunciou a aquisição do argentino Banco da Patagonia, Bendine falou ao GLOBO sobre os novos planos do BB, que em 2009 apresentou o maior lucro da história do mercado financeiro do país: R$ 10,147 bilhões. Para Bendine, não há riscos de perder essas conquistas no futuro: “O BB, da forma como foi estruturado, daqui para frente dificilmente terá um gestor que fará grandes derivações. São movimentos irreversíveis”.

Neste primeiro aniversário à frente do BB, qual o principal feito da sua gestão?

ALDEMIR BENDINE: Primeiro, por trás disso tudo, está o resgate do verdadeiro papel do BB na sociedade. O banco teve ao longo dos seus 201 anos de história momentos marcantes no país, notadamente no desenvolvimento econômico e social, e passava por um momento onde talvez o papel dele não fosse tão bem caracterizado. Ao tempo que ele tinha uma atuação cada vez mais sólida como um banco comercial, tinha deixado um pouquinho de lado o seu papel de agente público, de agente indutor do país. Isso coincidiu praticamente com a minha posse (em 23 de abril de 2009), que erroneamente foi atribuída a um movimento político. Talvez o grande marco dessa gestão tenha sido esse resgate do verdadeiro papel do BB e isso eu acho que a sociedade reconheceu. Isso foi muito coroado com a principal ação que o banco executou ao longo de 2009, que foi, num período de crise, talvez a mais grave que a nossa geração tenha conhecido, a de oferecer crédito. O BB saiu à frente porque tínhamos um quadro naquele momento que não apontava para uma necessidade de travamento da atividade econômica. No fim do ano, o banco realizou o maior resultado da história de uma instituição financeira neste país.

Não é um paradoxo dizer que o papel do banco é de agente público, mas que não há ingerência política?

BENDINE: Nós não somos um agente público propriamente dito. Nós somos uma sociedade de economia mista e é assim que a gente age. Ao tempo que o maior capital votante é da União, nós também temos uma grande base de sócios. Temos o compromisso muito forte com governança corporativa e com rentabilidade. Então, se existe alguém ainda que tem esse tipo de desconfiança (política) em relação ao banco, eu acho que é uma pessoa que não está bem atualizada. Prova disso é que, quando eu assumi a gestão, houve uma crise de desconfiança. As ações do banco, no anúncio, caíram em dois dias 10%. Na medida em que os analistas, os investidores, os próprios clientes e a sociedade passaram a entender a forma profissional com a qual o banco vinha sendo conduzido, isso acabou se revelando numa das mais altas valorizações (de ações) de um banco no ano passado. E isso está sendo corroborado agora com a recente concessão do status de Financial Holding Company pelo Fed (banco central americano, e que permite ao Banco do Brasil comprar outras instituições nos Estados Unidos).

Mas o governo deu orientações explícitas sobre a atuação que esperava do banco.

BENDINE: O controlador, seja numa empresa privada ou pública, é quem orienta uma diretoria executiva dos rumos que ele quer para a companhia. Isso é natural. E o Tesouro, o governo de uma forma geral, gosta de resultado. Até porque, ao fazer um movimento desse, gera contribuições para a própria União. Primeiro, é o pagamento de dividendos e, depois, de tributos e impostos. Ora, se o banco dá um resultado positivo, é um reforço de caixa extraordinário para o Tesouro. Então, eu acho que essa dicotomia, que muitas vezes tenta-se explorar, não existe.

Essa desconfiança do mercado quando sua gestão começou foi o momento mais difícil neste primeiro ano? Atrapalhou o trabalho?

BENDINE: É difícil tomar posse numa instituição onde se tem uma série de planos, que você quer imprimir uma velocidade muito forte e ao mesmo tempo você está sendo recebido com desconfiança. Eu estava muito ciente daquilo que eu desejava para o banco e em nenhum momento isso foi abalado. Respondemos com muito trabalho e, ao mesmo tempo, fazendo uma revisão em toda a estratégia de atuação e abrindo frentes para se trabalhar. Por exemplo, entrada em novos nichos, como o crédito imobiliário, e o processo de internacionalização. A compra do Banco da Patagonia é o primeiro grande momento desse processo. Também houve movimentos internos, com uma nova filosofia no modo de gestão do banco, voltada para as redes de agências.

Com as eleições chegando, e um novo governo assumindo em 2011, o senhor acha que esse novo perfil do BB pode ser mudado?

BENDINE: Isso é uma coisa inerente a qualquer empresa. A partir do momento em que há uma troca do seu controlador, é natural que passe por uma repactuação. É natural que o meu sucessor possa chegar lá e entender que está tudo errado e fazer uma nova proposta aos acionistas. Mas eu não acredito. O BB, da forma como ele foi estruturado, daqui para frente dificilmente haverá um gestor que fará grandes derivações dos movimentos iniciados pelo banco. São movimentos irreversíveis.

Daqui em diante, o foco é a internacionalização do banco ou fortalecer os novos nichos internamente?

BENDINE: Se olharmos o planejamento mais a médio prazo, temos alguns movimentos importantes. Primeiro, consolidar as fusões e aquisições (como as da Nossa Caixa e do Votorantim). Vamos passar por uma capitalização (de quase R$ 9 bilhões) e com isso melhorar a nossa estrutura patrimonial, para que o banco possa crescer, seja através da ampliação dos seus ativos, via carteira de crédito, seja através de fusões e aquisições. Segundo, nós temos um grande desafio que é melhorar a rentabilidade da base de cliente e atuação no mercado de São Paulo. O outro projeto em andamento, com a coroação da compra do Patagonia, é a internacionalização. Acredito fortemente na necessidade de se buscar novos mercados para se ter ganhos de escala, de sinergia e estrutura. O BB precisa ampliar suas fronteiras. O Brasil é hoje um país de empresas de atuação global e queremos estar onde elas atuam.

Depois da compra do Patagonia, e com a autorização do Fed, dá pra imaginar que as próximas aquisições do BB acontecerão nos Estados Unidos.

BENDINE: Já temos muito bem definidos nossos alvos, em quais lugares queremos estar, e onde houver oportunidades, ativos e estrutura que nos interessem, vamos fazer esse movimento. O banco está fazendo os melhores esforços para que de fato entre de forma mais firme no mercado americano, até porque lá, entre os nossos principais vetores, é o país com mais brasileiros, chegando a 1,4 milhão. Segundo, há presença muito forte de empresas brasileiras, cujo número tem crescido exponencialmente. Lá também é onde o fluxo de comércio só tem aumentado.

28/04/2010
- O Globo
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