Novo olhar sobre o superávit da PREVI

Raquel Balarin
Colunista

Desde 2007, nenhum dos cerca de 150 mil participantes do plano de benefícios definidos da Previ, o fundo de pensão dos funcionários do Banco do Brasil, paga um único centavo de contribuição, mesmo os que estão na ativa. O banco, patrocinador do fundo, também não. Essa suspensão de contribuições só foi possível porque a fundação acumula superávits desde 2003, com exceção do ano de 2008.

Ainda assim, o superávit acumulado da Previ – algo que pode ser mal comparado ao lucro de uma empresa – não para de crescer. Fechou 2009 em R$ 44,2 bilhões e cresceu R$ 17,9 bilhões só no ano passado. O desempenho da bolsa é o principal responsável por essa valorização. Apenas a participação da Previ na Vale, por exemplo, era avaliada em R$ 31,08 bilhões no fim do ano passado, enquanto o patrimônio total do fundo era de R$ 140,8 bilhões.

Com números dessa magnitude e em ano de eleição para Presidência da República e de troca de presidente e diretores da Previ, é natural que a discussão sobre o que fazer com o superávit do fundo tenha ganhado um contorno político. Mas a questão merece um olhar mais técnico e analítico, por conta de seu impacto na vida futura de milhares de participantes e, em última instância, na vida do contribuinte, já que o Tesouro Nacional é o controlador do BB.

Vamos lá, às regras. Lei de 2001 determina que ao menos 25% do superávit tem que ficar guardado, a título de contingência para os benefícios que serão pagos ao longo do tempo. Trata-se de uma espécie de colchão de liquidez. Grosso modo, isso significa dizer que, do superávit registrado de R$ 44,2 bilhões, o excedente já baixa para R$ 33,15 bilhões apenas com a aplicação da regra. Esse é o valor que entra na chamada reserva especial para revisão do plano. A Lei Complementar 109 também determina, de forma genérica, que após três anos de superávit, é preciso decidir o que fazer com ele: deve-se revisar o plano de benefícios. Se a opção for pela redução ou suspensão das contribuições, a revisão deve ser proporcional ao regime de contribuição. Um exemplo prático: se o patrocinador contribui com R$ 10, o participante também com R$ 10 e a decisão for diminuir a contribuição em 50%, cada um deles passaria a contribuir com R$ 5 – o corte de 50% é feito proporcionalmente. Detalhe: a regra também vale para o caso de déficit. Para cobrir o buraco, a responsabilidade é de ambos, patrocinador e associado.

Como a lei de 2001 era genérica, a Secretaria de Previdência Complementar (SPC), em 2008, propôs uma norma, que foi depois aprovada e se tornou a Resolução 26. Ali, são determinadas várias outras medidas de cautela com relação à apuração do superávit e sobre o que fazer com ele. Em primeiro lugar, a resolução prevê que o fundo deve adotar uma tábua atuarial mais atual, a AT 2000. Com dados da tábua, que indica tempo de vida esperado da população, entre outros números, são calculados os benefícios futuros do fundo. A Previ já adota essa tábua. As outras medidas apontadas pela resolução são a redução da meta atuarial para 5% (indicação de uma rentabilidade menor no futuro; hoje o fundo trabalha com 5,5%) e dedução, do superávit, de eventuais dívidas da patrocinadora e de possíveis desenquadramentos do fundo.

A Previ tem pelo menos três desenquadramentos importantes: os investimentos na Vale superam o limite dos 10% de investimentos totais do plano e as participações em duas empresas do setor elétrico, CPFL e Neoenergia, superam o limite de 25% do capital total das empresas.

A estimativa é de que os três desenquadramentos, somados, atinjam R$ 20 bilhões. A adoção da meta de 5% reduziria o superávit em mais R$ 4 bilhões. Em contas bem grosseiras, subtraídos esses valores dos R$ 33,15 bilhões do excedente de superávit, o número cairia para R$ 9,15 bilhões. Se esses ajustes da resolução fossem feitos primeiro e depois fosse separado o colchão dos 25%, a conta subiria um pouco, para R$ 15,15 bilhões. A distribuição, portanto, ficaria entre R$ 9,15 bilhões e R$ 15,15 bilhões. E mantida a regra da proporcionalidade, cada um dos grupos – patrocinador e associados – teria direito a algo entre R$ 4,58 bilhões e R$ 7,58 bilhões. Mesmo partindo de uma conta “grosseira”, é possível mostrar que a magnitude dos números é muito menor do que aquelas que vêm aparecendo nos jornais.

Participantes da Previ e entidades que os representam têm entrado com mandados de segurança na Justiça tentando derrubar a aplicação da Resolução 26. Muitos deles também defendem que a distribuição deveria ser feita apenas entre os participantes, o que não parece razoável. Assim como também não parece razoável que o Banco do Brasil, antes mesmo da decisão da Previ sobre o assunto, já tenha se apropriado em seu balanço de R$ 3,03 bilhões (2009) e R$ 5,06 bilhões (2008) a título de amortização sobre ganhos atuariais do fundo de pensão.

A Previ está agora debruçada sobre as regras e os números, tentando chegar à conta final. Depois, a questão terá de ser votada em conselho deliberativo, formada por três representantes do banco e três dos participantes. E nessa sessão, o presidente – seja ele Sérgio Rosa, ou o próximo indicado – não tem voto de Minerva.

Raquel Balarin é diretora de Conteúdo Digital do Valor e escreve quinzenalmente às quintas-feiras

 

16/04/2010
- Valor Econômico
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