PRESIDENTE DO FUNDO DE PENSÃO DO BB DIZ QUE INVESTIRÁ R$ 3 BI NO SETOR IMOBILIÁRIO ATÉ 2016 E QUE VAI MIRAR NOVA CLASSE MÉDIA DO PAÍS
MARIA CRISTINA FRIAS
KENNEDY ALENCAR
ENVIADOS ESPECIAIS AO RIO
O presidente da Previ, Ricardo Flores, 46, diz que investirá R$ 3 bilhões na aquisição de imóveis até 2016, em sua primeira entrevista exclusiva após assumir o comando do fundo de pensão do Banco do Brasil, em junho, no lugar de Sérgio Rosa.
O foco será em shopping centers e prédios comerciais de “alto padrão”, afirma. A Previ tem R$ 4 bilhões em imóveis -o que corresponde a 2,8% dos seus R$ 142 bilhões de patrimônio.
Entre as prioridades da nova gestão, ele revela o aumento da participação em grandes redes de varejo: “Existem oportunidades de ganho com o aumento do poder de compra, em especial das classes C e D”.
Flores rejeita vender o excedente do fundo em ações da Vale. Pela lei, a Previ não pode ter mais de 10% do capital em uma empresa. Hoje, 15% dos ativos estão na Vale.
O executivo diz conversar com a Previc, órgão regulador federal dos fundos, para fazer um ajuste até 2014.
Moderado, o ex-vice-presidente crédito do BB evita endossar as críticas do presidente Lula, feitas à Vale durante a crise. Afirma que ele e seus colegas enxergaram “mais as oportunidades do que as ameaças”, mas ressalva que “o respeito aos acionistas é fundamental”.
Quanto à participação da Previ na usina de Belo Monte (PA), prioridade do governo Lula no setor enérgetico, o executivo diz que “estuda a viabilidade e o retorno do projeto para eventualmente decidir se vai participar”.
Folha – Quais as prioridades na nova gestão da Previ?
Ricardo Flores – Dar continuidade ao trabalho que foi feito, um trabalho legal. Queremos agora enfatizar prioridades dentro do bom momento que vive o país. O mundo procura o Brasil. Vamos aproveitar as oportunidades para garantir o nosso principal compromisso, que é pagar benefícios para os atuais e futuros beneficiados. A Previ paga cerca de R$ 6 bilhões em benefícios.
Há alguma área da economia que priorizará?
Ampliar a participação no comércio varejista. Existem oportunidades de ganho. O aumento do poder de compra, em especial das classes C e D, eleva significativamente a atratividade do país para investidores nacionais e internacionais.
Pode citar uma empresa específica?
Estamos estudando. Mas é uma decisão investir mais no varejo.
O que pode ser diferente na sua gestão?
O grande guarda-chuva da infraestrutura. Concessões de estradas, petróleo e gás, comunicação, energia. Enxergamos belas oportunidades de investimento.
Pode apontar um negócio concreto?
Estamos estudando. Para o Brasil continuar a crescer de forma consistente, são necessários investimentos em infraestrutura. A Copa do Mundo de 2014 e a Olimpíada de 2016 reforçam isso.
A Previ tem mais de 10% dos seus ativos na Vale. Pela lei, não poderia estar acima desse percentual. O sr. pretende vender esse excedente?
Não está na ordem do dia. Temos até 2014 para nos ajustar. Estamos conversando com o órgão regulador, que é a Previc, buscando alternativas e um entendimento melhor dessa norma.
O sr. quer manter os investimentos na Vale?
Não trabalhamos [com a possibilidade] de venda de ações da Vale. É uma importante empresa nacional.
Eike Batista fez uma proposta ao Bradesco pela fatia do banco na Vale e também procurou fundos de pensão. O empresário procurou a sua gestão com esse interesse?
Não houve contato.
Na crise, o presidente Lula fez críticas à gestão do presidente da Vale, Roger Agnelli, que anunciou cortes de investimentos e demissões. É legítimo o presidente fazer esse tipo de pressão sobre uma empresa privada?
Não vejo como interferência [de Lula] ou [intenção de] querer gerir a empresa. A Vale é uma grande empresa, com reflexos no Brasil e no exterior. Vejo com naturalidade a preocupação do presidente da República, tendo em vista a relevância da Vale.
O sr. foi vice-presidente de crédito do BB, quando o banco aplicou uma política de crédito agressiva e ganhou mercado, na contramão da iniciativa privada, que pisou no freio. Tudo indica que o sr. colocará o pé no acelerador. Se estivesse na Vale no lugar de Agnelli, pisaria no freio ou no acelerador?
O Banco do Brasil soube aproveitar muito bem as oportunidades que a crise ofereceu. No caso do banco, tínhamos o entendimento de que a crise não seria tão longa e que o Brasil sairia dela com maior rapidez. Não tenho como avaliar se a decisão da Vale foi acertada ou não. Entendo que o respeito aos acionistas é fundamental, cumprido sempre o dever de lealdade com a companhia, mas enxergando o ambiente político, econômico e social ao qual a Vale ou outra empresa está sujeita.
Essa decisão aconteceu após troca de comando no BB por insatisfação do governo com a gestão anterior.
Houve troca e substituições de vice-presidentes. Essa equipe entendeu que deveria tocar o banco enxergando mais as oportunidades do que as ameaças. Foi uma decisão acertada. O banco apresentou em dezembro o maior lucro de sua história, recuperou a liderança em ativos e tem a menor inadimplência comparado com os concorrentes.
O sr. não considerou ingerência do BB sobre a Previ, quando o vice-presidente do BB Robson Rocha afirmou que conselheiros da Previ deveriam apresentar produtos do banco em empresas privadas em que são conselheiros?
Não vi como ingerência. Ele quis passar o entendimento de que, se houver condições iguais de produto, por que não os conselheiros indicados pela Previ argumentarem que se faça negócio com o BB? Entretanto, a minha posição é de que o dever de lealdade do conselheiro é com a companhia. Não é função do conselheiro indicar este ou aquele banco.
O sr. não gostou da manifestação de Rocha…
Não é a função do conselheiro.
Já teve algum encontro com o presidente Lula para ouvir em qual linha atuar?
A prerrogativa de indicar o presidente da Previ é estatutariamente do BB. O nome foi referendado pelo conselho da Previ. Não tive contato com o presidente sobre os planos da Previ. Vejo com naturalidade uma conversa com o presidente da República ou outras lideranças técnicas do Brasil, se ocorrer.
E com a ex-ministra Dilma Rousseff?
Não.
A Previ vai ampliar sua participação em grandes empresas nacionais, em operações como fez com a Embraer e a Brazil Foods (resultado da fusão Perdigão-Sadia)?
É uma boa lógica. O Brasil vive um momento especial e as suas empresas buscam fortemente uma internacionalização. O que a Previ puder fazer para tornar as empresas nacionais mais robustas e globais é uma boa lógica. Sempre entendendo que deve respeitar os limites legais para investimento e a rentabilidade para o fundo.
Em quais setores?
O setor de energia elétrica pode ser melhor pensado. O setor de produtos alimentícios pode passar por uma melhor consolidação. [Também] o setor varejista. Mas temos de ter preocupação de não consolidar concentrando e, com isso, gerar graus ruins de dependência.
A Previ participará de Belo Monte? Nos bastidores, o Palácio do Planalto estimula a Previ…
A Previ não participou do leilão diretamente. As empresas que perderam não podem participar. Estamos estudando a rentabilidade e a viabilidade do projeto, para eventualmente decidir.
De que forma será a eventual participação?
A Neoenergia e a Vale, por terem participado do leilão, já não podem. Estamos buscando alternativas que respeitem a legislação e que tragam uma boa remuneração para a Previ.
A Previ vai vender o terreno do hospital Umberto Primo, em São Paulo?
Há questões relacionadas que estão sujeitas a sigilo. Há a decisão de vender o imóvel para a proposta que trouxer o melhor retorno.
A Previ está interessada em comprar imóveis em SP?
Não posso falar deste ou daquele imóvel, mas há um interesse da Previ em crescer em ativos na área imobiliária, particularmente em prédios comerciais e em shoppings, desde que bem localizados e modernos.
Vai investir em shoppings a serem construídos?
No segmento de imóveis, o foco está em shopping centers e em empreendimentos comerciais de alto padrão. Esse tipo de ativo propicia excelente rentabilidade. A previsão é aumentar de 2,8% para 5% do total dos nossos investimentos em imóveis, até 2016. Ao longo desse período, será um aporte de cerca de R$ 3 bilhões, já que a Previ tem R$ 4 bilhões aplicados em empreendimentos imobiliários. Nossos investimentos estão concentrados em São Paulo, Rio e Brasília. Mas podemos ampliar investimentos para outras localidades, por meio de compras e de fundos imobiliários.
PERFIL
Presidente da Previ começou no BB aos 14 anos
O economista pernambucano Ricardo José da Costa Flores, 46, assumiu a presidência da Previ (Caixa de Previdência dos Funcionários do Banco do Brasil) no mês passado.
Começou a trabalhar no banco aos 14 anos, como menor-aprendiz. Fez pós-graduação em projetos de investimentos (FGV) e dois MBAs na USP.
Até maio, respondia pela vice-presidência de crédito, controladoria e risco global do banco. De perfil moderado, o preferido do presidente Lula para o cargo é cuidadoso em suas afirmações e tem bom trânsito político.
Durante sua gestão na área de crédito, o banco ampliou o volume de empréstimos, como queria Lula.
Em 2009, o BB obteve o maior lucro de sua história, de R$ 10,2 bilhões.