J osé Pastore
A falta de uma regulamentação clara do processo de terceirização tem afetado severamente as empresas estatais. Muitas vêm sendo objeto de condenações judiciais que redundam em pesadas multas e integração de empregados de empresas prestadoras de serviços em seus quadros. No nível federal, podem ser citados a Petrobrás, as subsidiárias da Eletrobrás, o Banco do Brasil, Caixa Econômica, o BNDES, a os Correios, hospitais e universidades públicas e vários outros. São comuns as multas que estipulam R$ 10 mil por dia e por trabalhador que participa da chamada terceirização ilícita, além de pesadas indenizações por dano moral coletivo.
O ambiente está ficando aflitivo para o governo num tempo em que as parcerias entre as atividades dos setores público e privado são cada vez mais necessárias. São elas que potencializam a criatividade, facilitam a transferência de tecnologias e fazem avançar a competitividade das empresas. Não há alternativa. Nenhuma empresa – pública ou privada – consegue fazer tudo sozinha. A divisão do trabalho é essencial para atingir os níveis de produtividade que permitem crescer, gerar lucros e ativar os investimentos.
Quando se multa e se impede uma empresa de terceirizar, bloqueia-se sua capacidade de crescer. No caso das estatais, isso eleva seu custo de operação e afeta a qualidade dos serviços. Um hospital público, assim como uma universidade ou um banco, tem inúmeras atividades que são mais bem executadas por profissionais especializados e que pertencem a outras empresas. O mesmo ocorre com uma produtora de petróleo. Aliás, nesse setor, no mundo inteiro, as operações são feitas com um terço de profissionais fixos e dois terços terceirizados – exatamente o que ocorre com a Petrobrás. Os primeiros realizam atividades que as empresas consideram estratégicas e o pessoal terceirizado realiza as demais.
Dentre os motivos mais frequentes para a punição das empresas estatais estão o desrespeito à terceirização dita ilícita por incidir em atividades-fim das contratantes e o alegado descumprimento do procedimento de concurso para a admissão de pessoal.
A exigência da atividade-fim decorre da Súmula 331 do Tribunal Superior do Trabalho, da qual se depreendem dois problemas. O primeiro se refere à enorme dificuldade de distinguir uma atividade-meio de uma atividade-fim. O segundo decorre da irrelevância dessa distinção.
Não existe nenhum manual de direito do trabalho que separe de modo claro uma atividade-meio de uma atividade-fim. Mesmo que tal distinção fosse possível, ela não tem a menor relevância para aquilo que é prioritário na terceirização, que é a garantia da proteção para todos os trabalhadores que participam do processo tanto do lado da prestadora como da tomadora de serviços. De que adianta respeitar a aludida distinção se a prioridade é proteger os trabalhadores? Quanto ao segundo motivo, é claro que o concurso público nas empresas estatais é reservado aos que vão integrar seus quadros fixos e não aos profissionais que integram os quadros de empresas que, como contratadas, prestam serviços específicos e determinados.
A terceirização constitui um elemento importante na economia brasileira e, graças ao aprimoramento constante de seus serviços, as empresas apresentam grandes ganhos de eficiência e de competitividade. Isso tem sido fundamental para o aperfeiçoamento dos trabalhadores, o que acaba proporcionando ganhos generalizados para a sociedade.
A grave situação das empresas estatais no que tange à terceirização é um motivo mais do que relevante para disciplinar de uma vez por todas a contratação de serviços especializados com as devidas garantias aos trabalhadores. Em meu entender, o projeto de lei (PL) que melhor contempla as exigências da terceirização moderna e não precarizante é o PL 4.330/2004, ora em discussão na Câmara dos Deputados.
* JOSÉ PASTORE É PROFESSOR DE RELAÇÕES DO TRABALHO DA FACULDADE DE ECONOMIA E ADMINISTRAÇÃO E MEMBRO DA ACADEMIA PAULISTA DE LETRAS