A partir de março de 2020, os emissores de cartões de crédito serão obrigados a usar a taxa de câmbio do dia das compras realizadas por seus clientes no exterior para converter os valores a serem pagos em reais. A nova regra foi antecipada ontem pelo presidente do Banco Central, Ilan Goldfajn, em entrevista a jornalistas pouco antes da divulgação de uma circular que estabeleceu o novo modelo.
Segundo Ilan, muitas vezes há uma variação grande na cotação do dólar e de outras moedas entre as datas da compra e do pagamento da fatura, e esse risco é arcado pelo consumidor. "Às vezes acontece que o que você compra não é exatamente o que você paga. Muita gente põe a mão na cabeça e diz: "o câmbio se depreciou"", disse Ilan, acrescentando que a medida vem no sentido de "facilitar a vida do cidadão". Atualmente, os bancos são obrigados a usar como padrão a taxa de câmbio vigente no dia do pagamento da fatura do cartão. Opcionalmente, eles podem oferecer ao cliente a alternativa de adotar a taxa do dia da compra. Essa lógica será invertida. A taxa obrigatoriamente oferecida deve ser aquela vigente na data da compra. Os emissores de cartão que assim preferirem também podem ofertar a outra opção. Nesse caso caberá aos clientes fazer a escolha. Ilan lembrou que atualmente muitos cartões já oferecem aos clientes as duas alternativas de conversão. Ainda assim, o BC entendeu que era preciso um tempo de transição para o novo modelo para que todas as empresas fizessem as adaptações necessárias em seus sistemas. A circular do BC estabeleceu que os emissões de cartão devem divulgar, diariamente, em seus canais de atendimento a taxa do dólar aplicada no dia anterior para converter em reais os gastos em moeda estrangeira dos clientes. De maneira geral, a decisão de obrigar os bancos a oferecer aos clientes uma "trava" para o dólar no momento das compras internacionais reduz o risco cambial aos consumidores e padroniza algo que já era oferecido pela indústria, mas de maneira tímida. Hoje, a maioria dos clientes paga pelo câmbio do momento de fechamento da fatura, além da diferença desta data com a do efetivo pagamento da conta. Segundo Fabrício Winter, líder de projetos da consultoria Boanerges & Cia, a regra busca proteger o cliente, para ele ter a opção de escolher se quer correr o risco cambial ou não. "O banco é especialista em avaliar e correr risco da variação cambial, mas ele vinha se protegendo desse risco da forma como a cobrança vinha ocorrendo, e expondo o cliente." A Caixa Econômica Federal oferece a "trava" do dólar no momento da compra internacional desde o primeiro semestre do ano passado. A escolha era feita no momento de desbloquear o cartão para uso internacional. Em setembro, a fintech de cartões de crédito Nubank passou a trabalhar com o mecanismo em todas as compras de seus 5 milhões de clientes. A taxa de câmbio a ser fixada pode ser automática ou demorar até sete dias a partir da compra, dependendo do processamento da operação. Segundo a Caixa, a maioria dos clientes têm optado pela conversão de câmbio pelo dia da compra. Banco do Brasil, Bradesco, Itaú e Santander não trabalham com a "trava", mas com outros mecanismos de redução do risco cambial ao cliente, como os cartões pré-pagos. O Itaú ainda oferece uma espécie de hedge: o cliente fecha uma cotação em determinado dia para gastar uma quantia em compras internacionais já sabendo qual será a taxa de câmbio. Já o BB, Bradesco e Santander fazem a antecipação do pagamento da fatura do cartão, usando o dólar do dia para conversão do saldo em dólar para reais, mas a diferença do câmbio em relação ao do pagamento da fatura é cobrado. "Essa opção foi dada muito mais para liberar o limite do cartão, e o cliente ter a possibilidade de gastar mais, do que para travar o câmbio", afirmou Larissa Arruy, sócia da área de bancos e serviços financeiros do escritório Mattos Filho. Questionados sobre a adequação à nova regra, o BB diz que "vai atender à nova legislação até a data determinada". Já o Itaú afirma que "está empenhado em promover as mudanças". O Bradesco informou que "a circular ainda não foi regulamentada" e o Santander, que "está estudando o tema". Em nota, a Abecs, que representa as empresas de cartões de crédito, disse que vinha discutindo com o Banco Central possíveis aperfeiçoamentos à sistemática de conversão dos gastos em moeda estrangeira e que considerou a medida positiva. "Trata-se de mais uma opção de pagamento ao consumidor, que já tem sido ofertada por alguns emissores." O presidente do BC disse que a autarquia ainda não está satisfeita com os cartões de crédito e quer que eles ofereçam prazos de pagamento menores. "Queremos que o sistema ofereça já no começo do ano um novo produto, com prazos menores para o lojista, com crédito mais barato", afirmou Ilan. Ele disse que esse produto está em fase final de formatação e deve ser adotado de foram voluntária pelo sistema.
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